O QUE NÃO É UMA IGREJA REFORMADA


Por Jonathas Diniz



Iremos descrever, brevemente, 5 características que não representam a natureza e o perfil de uma Igreja Reformada. A intenção é corrigir ideias preconcebidas e aumentar a aproximação de pessoas a essa rica tradição. 

Vejamos, então, o que NÃO é uma Igreja Reformada:


1) Uma igreja sectária ou arrogante

Ser uma igreja confessional, que abraça uma tradição doutrinária, não implica em sectarismo. Uma igreja reformada não é uma seita isolada, intransigente, intolerante, que se esquiva de relacionamento com outras igrejas cristãs ou que se considera superior a todos os demais grupos evangélicos. Cristãos que se dizem "reformados", mas que demonstram arrogância doutrinária ou soberba teológica estão, na verdade, muito distantes da fé bíblica e reformada.

A Confissão de Fé Batista de Londres de 1689 (que é uma confissão batista reformada), declara nos capítulos 26:14 e no 27:2:


Os membros de cada igreja local devem orar continuamente pelo bem e pela prosperidade de todas as igrejas de Cristo, em todo lugar. [...] Portanto, as igrejas - quando dispostas pela providência de Deus de uma maneira em que isto seja possível - devem desfrutar da oportunidade e das vantagens de manterem comunhão entre si, a fim de promoverem a paz, o amor, e a edificação mútua. [...] Esta comunhão, segundo a norma do evangelho, deve especialmente ser exercida no âmbito familiar  e nas igrejas;  mas, conforme Deus ofereça oportunidade para isso, também deve ser estendida a toda a família da fé, a todos os que, em todo lugar, invocam o nome do Senhor Jesus.



2) Uma igreja "modinha"

A fé reformada está ganhando mais espaço no Brasil nos últimos anos, graças a pregadores reformados de destaque, como Hernandes Dias Lopes, Augustus Nicodemus, Renato Vargens, Josemar Bessa, Franklin Ferreira, Jonas Madureura etc. Mas esses pastores não criaram essa fé. Não se trata de um novo movimento religioso, de uma onda calvinista, de um modismo evangélico. Uma igreja reformada é herdeira da tradição doutrinária da Reforma Protestante do século XVI, cujo principal fundamento é o Sola Scriptura (Somente a Escritura), segundo o qual o conteúdo da mensagem cristã deve ser nada mais, nada menos que toda a vontade revelada de Deus em Sua Palavra. 

3) Uma igreja espiritualmente "fria"

"Fria" é a marca que evangélicos de alguns segmentos pentecostais costumam atribuir a igrejas históricas e confessionais, por talvez não enfatizarem os dons espirituais na vida da igreja. Não é propósito desse breve texto discutir esse tema. Mas o que pode-se dizer, a princípio,  é que tal associação está mais baseada em reducionismo e desinformação do que na compreensão bíblica. O que é ser "quente" ou avivado? O que é ser cheio do Espírito Santo? Será que tem mais a ver com uma vida que manifesta o fruto do Espírito (Gl 5.22,23) ou em experiencialismo e sentimentalismo? Além disso, deve-se considerar que nem todas as igrejas reformadas são unânimes no que diz respeito aos dons. Algumas são carismáticas (creem na continuidade e contemporaneidade dos dons) e outras não. A teologia reformada não "bate o martelo" nessa questão. É possível ser carismático e reformado ao mesmo tempo. O ponto de convergência será sempre a busca da base bíblica tanto para a fé quanto para a prática na vida da igreja. E buscar essa centralidade da Escritura não significa desprezar o poder do Espírito Santo. Como observa Franklin Ferreira, "precisamos destacar que a Escritura é essencial para nossa fé, pois é ela que fundamenta tudo o que fazemos na igreja - culto, pregação, ensino, oração etc. - porém, não podemos esquecer que é o Espírito Santo que a toma e a usa com poder em nossa meio" (p, 60).

4) Uma igreja intelectualista 

"É uma igreja onde se debate teologia e se fala de Calvino o tempo todo?", pode ser a pergunta de alguém. É claro que não! Há sim uma preocupação com a doutrina correta, com a exposição fiel da Escritura e com a confessionalidade. Há sim um cuidado com a leitura, a reflexão teológica e o amadurecimento doutrinário dos cristãos, especialmente dos ministros da Palavra. Mas isso não significa academicismo, intelectualismo ou conhecimento frio da fé, divorciado da piedade, da devocionalidade e da ética. A fé reformada não separa o que Deus uniu: doutrina correta e vida correta; ortodoxia e ortopraxia; crença e vivência; compreensão e devoção; biblicidade e espiritualidade; contemplação e ação; conhecimento na cabeça e fogo no coração. Como muito bem destacou Hermisten Maia (p.201):

A força prática da teologia reformada não está simplesmente em seu vigor e capacidade de influenciar intelectualmente os homens, mas no que tem produzido na vida de milhões de pessoas, conduzindo-as, em submissão ao Espírito, à fidelidade bíblica e a uma ética que se paute pelas Escrituras. [...] O reformado [vive] a plenitude do seu tempo para a glória de Deus". 

5) Uma igreja de costas para a evangelização

Ser reformada não é ser fechada no ensino doutrinário de seus membros e pouco preocupada com a evangelização e com as missões. O entendimento de que a salvação é obra exclusiva e soberana de Deus, aplicada eficazmente na vida de todos aqueles que Ele elegeu antes da fundação do mundo, não inibe a proclamação do evangelho; pelo contrário, a incentiva. Porque a teologia reformada ensina que a pregação é justamente o meio pelo qual o Espírito gera a fé salvadora no coração do eleito. 

Os reformadores destacaram bastante a afirmação de que 'a fé vem pelo ouvir, e o ouvir, pela Palavra de Cristo' (Rm 10.17). Nada mais e nada menos. O único órgão ativo, por assim, dizer, para a nossa salvação é o ouvido [...] Respondemos à obra de Deus por sermos atraídos pela graça e ouvimos a Palavra; e dessa forma somos movidos a ter fé e a descansar em Deus"(FERREIRA, p. 64). 

Portanto, é um erro afirmar que a fé reformada não promove o zelo missionário nas igrejas. Na excelente explicação de Thomas Magnun,

Historicamente vimos que é o oposto. Calvino enviou missionários ao Brasil e a evangelização posterior do Brasil também se deu pelo trabalho Calvinista. Os Estados Unidos são frutos de uma peregrinação e colonização cristã, e aí é valioso um estudo da vida e obra dos Puritanos. O zelo por missões está em nossas raízes e deve arder em nosso coração, como foi com nossos irmãos no passado. 

William Carey (1761-1834), batista reformado inglês, conhecido como o "pai das missões modernas", foi missionário na Índia e um dos maiores tradutores da Bíblia. Robert Moffat (1795-1862) e David Livingstone (1813-1873), homens que assim como Carey professavam a fé reformada, exerceram papel importante na evangelização da África. David Brainerd (1718-1747), ministro calvinista, foi notável por sua missão entre os índios no Oeste de Massachusetts, bem como Jhonatas Edwards, grande pregador e teólogo que também foi missionário entre os índios. Para citar alguns nomes contemporâneos que se empenham em esforços de evangelização mundial, temos os conhecidos pastores norte americanos John Piper e Paul Washer. Entre reformados brasileiros não poderíamos deixar de citar dois nomes importantes: o Dr. Russel Shedd (1929-2016), fundador das edições Vida Nova, que dedicou-se por décadas à evangelização do nosso país e à preparação de líderes; e o missionário Ronaldo Lidório, fundador do Instituto Antropos e tradutor da Bíblia, que tem empreendido grandes esforços na evangelização de povos não alcançados.


Como disse o pastor reformado Stuart Olyott (p.13), "a obra de Deus no mundo e a pregação estão intimamente ligadas. Em todos os lugares em que a pregação é menosprezada ou está ausente, ali a causa de Deus passa por um tempo de improdutividade. O Reino de Deus e a pregação são irmãos siameses que não podem ser separados. Juntos, eles permanecem de pé ou caem".


Conclusão

Espero que ao ler esse pequeno artigo, a sua visão acerca do que seja uma Igreja Reformada tenha sido ampliada, reforçada ou corrigida. Estamos plantando em Itaperuna uma igreja batista de confissão reformada. Caso queria conhecer mais sobre a igreja, a fé reformada, as doutrinas da graça e outros temas, seria excelente combinarmos uma conversa. Aqui nesse blog, você pode encontrar outros artigos que irão lhe ajudar no conhecimento desses assuntos. Que Deus aumente cada dia mais no seu coração o interesse por sua Santa Palavra.

Referências

CONFISSÃO DE FÉ BATISTA DE LONDRES DE 1689. Disponível em: http://www.monergismo.com/textos/credos/1689.htm.


FERREIRA, Franklin. Pilares da Fé: a atualidade da mensagem da Reforma. São Paulo: Vida Nova, 2017.

MAGNUM, Thomas. O Calvinsmo enfraquece a obra missionária? Um levantamento histórico. Disponível em: https://bereianos.blogspot.com/2015/01/o-calvinismo-enfraquece-obra.html.


MAIA, Hermisten. Fundamentos da Teologia Reformada. São Paulo: Mundo Cristão, 2007.

OLYOTT, Stuart. Pregação Pura e Simples. São José dos Campos: Editora Fiel, 2008.










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